Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier

Tempo de leitura: 12 minutos

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier construídas no século 19, período particularmente conflituoso, de guerras, crises políticas, revoluções, mudanças de regimes e governantes, essas casas de espetáculos conseguiram assim mesmo, cada uma em seu tempo e sua cena lírica, tornaram-se o centro cultural e vital da aristocracia parisiense e de atenção de vários países da Europa.

Esse fenômeno de escala internacional que muitos pensam ter surgido com a Ópera Garnier, a partir de 1875, na realidade teve sua origem em duas importantes óperas, poucas conhecidas e que não existem mais, chamadas: Ópera de la rue de Richelieu (em 1793) e Ópera Le Pelletier (1821).

Academia Real de Dança.

Em 1661 foi fundada pelo rei Luís XIV (1643-1715), a Academia Real de Dança, (Académie Royal de Danse) que tinha como objetivo o ensino e a prática da dança nacional. Em 1669, foi integrada a essa intuição, a Academia da Ópera formando assim a companhia nacional de óperas e balés da França, chamada de forma única: Ópera de Paris.

As óperas, durante o século XVII e XVIII ficaram concentradas em Paris, em volta de dez salas, muitas vezes pequenas, inconfortáveis e maus construídas.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Teatro do “Palais-Royal” (ou Sala do “Palais-Royal”) incendiada, em 6 de abril de 1763.

Ao longo do tempo, por razões particulares de cada uma, foram se fechando ou acabaram sendo destruídas por incêndios, levando a necessidade de se construir novas salas na cidade, mais modernas, maiores e para um público cada vez mais exigente em prazeres e divertimentos.

Abaixo encontra-se em ordem cronológica um resumo histórico de duas da principais óperas e assim entendermos um pouco melhor a relação que existem entre elas e a da Ópera Garnier, que descreverei no próximo artigo.

Ópera de la rue Richelieu.

Construído entre 1792 e 1793, pelo arquiteto neoclássico, Victor Louis (1731-1800), em plena época revolucionária a pedido de Marguerite Brunet (1730-1820) mais conhecida no meio artístico como Mademoiselle Montansier, amiga da rainha Maria Antonieta (1774-1793) e Luís XVI (1774-1793).

Mademoiselle Montansier ou Marguerite Brunet (1730-1820).

Mulher empresária dinâmica nomeada diretora de espetáculos da Corte de Versalhes e de vários outros teatros como: Fontainebleau, Saint-Cloud, Marly, Compiègne, Rouen, Caen, Orléans, Nantes e Le Havre.

Inaugurado oficialmente em 15 de agosto de 1793, como Teatro Nacional de Paris era chamado popularmente pelo nome da sua proprietária: Sala Montansier ou Ópera Montansier.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Antiga “Salle Montansier” chamada mais tarde por “Ópera de la rue de Richelieu”.

Teatro que infelizmente ela teve pouco tempo de usufruí-lo, pois alguns meses depois, em 15 de novembro de 1793, depois de ver vários de seus amigos serem guilhotinados, sua propriedade foi confiscada pelo Comitê Revolucionário, e ela enviada a prisão acusada de querer incendiar a Biblioteca Nacional de Paris e de ter recebido dinheiro da rainha Maria Antonieta e dos ingleses, durante a construção da obra.

Em setembro de 1794, Mademoiselle Montansier absolvida de todas as acusações recebeu como indenização uma alta compensação financeira e livre para abrir outras salas de espetáculos, mas o seu teatro da Rua Richelieu, tornou-se definitivamente propriedade do Estado.

Mademoiselle Montansier morreu em 1820, ao 90 anos como proprietária de um outro teatro que havia comprado em 1807 e que ainda existe, chamada em francês, Théatre des Variétés (Teatro de Variedades).

Théatre des Variétés em Paris. Foto: Emeric84.

A Ópera Montansier foi reaberta em 07 de agosto de 1794, com dois outros nomes: Teatro das Artes e Academia Nacional de Música, mas ficou popularmente conhecida como Ópera de la rue de Richelieu.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Ópera de la rue de Richelieu (Ópera Montansier ou “Théâtre des Arts”). Foto: Arquivos Nacional.

Durante todo o período imperial de Napoleão Bonaparte I (1804-1814/1815) e a restauração com o rei Luís XVIII (1814/1815-1824), a Ópera serviu como a principal sala de espetáculos de Paris, frequentado principalmente por grande alta sociedade burguesa da época e membros do governo.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Vista interior da Ópera de la rue Richelieu. Desenho do arquiteto Victor Louis.

Em 14 de fevereiro de 1820, o Duque de Berry, Carlos Fernando de Artois (1778-1820), sobrinho do rei Luís XVIII (1814/18150-1824), e filho do futuro rei Carlos X (1824-1830) foi assassinado na porta do teatro por um fanático bonapartista, chamado Louis Pierre Louvel (1783-1820) que pensava estar eliminando o último descendente Bourbon e pretendente ao trono da França.

Louvel (1783-1820) assassino do duque de Berry (1820). Museu Carnavalet.

Puro engano dele, sete meses depois, nasceu seu filho o duque de Bordeaux, Henrique de Artois (1820-1883), “a criança do milagre”.

La Mort du duc de Berry, le 13 février 1820”, por Édouard Cibot (1799-1877). Museu Carnavalet.

Luís XVIII, logo após o assassinato, ordenou que todas as festividades de carnaval dos dias 14 e 15 de fevereiro de 1820 fossem anuladas, que a Bolsa de valores festas, bailes e todos comércios públicos fossem fechados, e principalmente que a Ópera de la rue Richelieu fosse demolida e construído no lugar, um monumento expiatório em homenagem ao Duque de Berry.

Depois da revolução de 1830 (As três Gloriosas) e a abdicação do rei Carlos X, irmão de Luís XVIII, e pai do falecido Duque de Berry, o monumento também foi demolido e a urna funerária transferida para a Basílica de Saint-Denis.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Monumento expiatório para o Duque de Berry. Demolido em 1830. Coleção: Bnf.

Em 1839, foi construído no local, por ordens do rei Luis Filipe I (1830-1848) uma Praça cercada de árvores batizada “Place Richelieu“, e alguns anos depois (1844) foi decorada com a atual Fonte Louvois criada pelo arquiteto Louis Visconti (1791-1853).

Square Louvois (2° distrito de Paris). Foto: Wikimedia Commons.

Refeita sobe Napoleão III, foi reinaugurada em 1859 com nome de “Square Louvois”.

Ópera Le Peletier.

Com a demolição da Ópera de la rue Richelieu em 1820, uma nova sala precisou ser urgentemente construída para atender um público exigente de divertimentos (bailes, festas, encontros…) e de grandes espetáculos de óperas, de danças e de músicas.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Ópera Le Peletier (1821). Livraria Pública de Nova Iorque.

A área escolhida fazia parte do jardim do “Hôtel de Choiseul“, antiga mansão particular do duque Étienne-François de Choiseul (1719-1785), principal ministro de Luís XV (1715-1774) construída entre 1755 e 1757.

A propriedade que já havia sido declarada bem nacional pelo comitê revolucionário em 1793, e ocupada por militares, em 1804 serviu como residência do governador de Paris e em 1812, sede do Ministério de Manufaturas e Comércio e propriedade definitiva do Império.

Entrada da “Ópera Le Peletier”, (Academia Real de Música), na rue Le Pelletier.

A Ópera Le Peletier (ou Sala Le Peletier) foi rapidamente construída com poucos recursos pelo arquiteto François Debret (1777-1850) usando na construção materiais frágeis, como gesso e altamente inflamáveis como madeira nas suas estruturas, além de vários elementos decorativos e estruturais da antiga Ópera de la rue Richelieu que haviam sido desmontados e reconstruídos nessa nova Ópera.

Em praticamente um ano de obras, iniciadas em 13 de agosto de 1820 foi finalizada para ser inaugurada em 16 de agosto de 1821 como um teatro provisório, pois o governo procurava por um área maior e melhor situada, para um projeto definitivo.

Recebeu vários nomes, mas ficou realmente conhecida como Ópera Le Pelletier, por estar localizada na rue Le Pelletier.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Litografia “Fachada da Ópera Le Peletier”, de C. Motte. Museu Carnavalet

Quanto aos nomes oficiais foram mudando conforme o soberano que se encontrava no poder.

Entre 1821 e 1848, durante o período da Restauração da monarquia, com os reis: Luís XVIII (1814/1815-1824), Carlos X (1824-1830) e Luís Filipe I (1830-1848), chamava-se: Académie Royale de Musique.

Entre 1848 e 1852, como o primeiro Presidente da França, Carlos Luís Napoleão Bonaparte, futuro Napoleão III (1852-1870), chamava-se: Académie nationale de Musique.

Entre 1852 e 1870, durante o Segundo Império, com Napoleão III, passou a ser chamada de Académie Impériale de Musique, e por último entre 1871 e 1873, na Terceira República, voltou a ser chamada de Académie nationale de Musique.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Interior da sala Le Peletier, par Gustave Janet em 1858.

O salão era amplo, bem distribuído, com grandes aberturas e tinha uma excelente acústica devido a leveza da estrutura de madeira, do teto, da cúpula e das paredes. Tinha uma capacidade aproximadamente 1.800 lugares.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Baile de máscara na Ópera Le Peletier. Gravura 1840.

A Ópera também beneficiou-se das novas tecnológicas do momento como o uso pela como 1° vez do gás de hidrogênio, possibilitando a iluminação da fachada, dos corredores, do lustre central da plateia, o palco e nos efeitos de cena.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Inauguração da Salle Le Peletier com a Ópera: “Les Bayadères”, em 1821. Imagem: Gallica.

O compositor e crítico musical da época Castil-Blaze (1784-1857) escreveu o seguinte comentário sobre a Ópera Le Peletier:

“Pour les spectateurs assis au parterre, la salle Le Peletier est absolument la même que la salle
Richelieu, seulement on a donné six places de plus à l’ouverture de l’avant-scène. Le théâtre est beaucoup plus profond que l’ancien, les corridors plus larges, une immense galerie servant de foyer au public ; telles sont les améliorations que l’on remarque dans la nouvelle salle ; mais gare à l’incendie ! Il serait effroyable. Cet édifice, n’ayant pas de murs pour contenir le feu, formera cheminée…

Tradução Livre:

Para os espectadores sentados na plateia, a sala Le Peletier é absolutamente a mesma que a sala

Richelieu, apenas mais seis cadeiras foram instaladas na abertura do proscênio. O teatro é muito mais profundo que o antigo, os corredores mais amplos, uma imensa galeria servindo de hall ao público; essas são as melhorias que se nota na nova sala; mas cuidado com o fogo! Seria terrível. Este edifício, sem paredes para conter o fogo, formará uma lareira …”.

Durante anos a sala foi palco de importantes óperas e bales, recebendo os maiores compositores e os mais famosos cantores do século XIX.

Atentado a Napoleão III na Ópera le Peletier:

Em 14 de janeiro de 1858, o imperador Napoleão III (1852-1870) e sua esposa a imperatriz Eugénia de Montijo (1826-1920) quando chegavam escoltados por soldados a cavalos, para assistirem a um espetáculo sofreram um grave atentado a bombas, bem em frente a entrada.

Graças a blindagem da charrete, o casal imperial escapou sem nenhum arranhão, mas entre soldados, guardas, agentes de polícia, espectadores e passantes foi registrado 156 pessoas feridas e 12 pessoas mortas.

“Atentado de Felice Orsini contra Napoleão III em frente a de Ópera Le Peletier em
14 de janeiro de 1858″, obra de H. Vittori Romano, pintado em 1862.

Napoleão III e a esposa Eugénia, aconselhados a não criarem um movimento de pânico nas pessoas que os aguardavam no interior do teatro e que certamente escutaram as três explosões, entraram e assistirem todo o espetáculo, como se nada tivesse acontecido.

O mentor do atentado, o italiano Felice Orsini (1919-1958), revolucionário que lutava pela independência da Itália, juntamente com mais três compatriotas Pieri, Gomez e Rudio foram presos e julgados poucos meses depois.

Felice Orsini, autor do atentado contra Napoleão III,
em 14 de janeiro de 1858. Obra de Louis Bucheister.
Musée Carnavalet.

Em 13 de março de 1858, Orsini e Pieri foram guilhotinados, quanto a Rudio e Gomez foram condenados a prisão perpétua com trabalhos forçados.

Consequência desse atentado, o imperador Napoleão III decidiu intervir militarmente na Itália, para liberar as cidades ocupadas pelos austríacos e tomou a decisão que fosse construído uma novo teatro em Paris, (futura Ópera Garnier, próximo artigo), moderno, rico, espaçoso e majestosamente bem localizado de forma a marcar seu governo na história da França.

Com as mudanças frequentes de governo e diversas crises políticas, a Ópera Le Peletier ainda permaneceu funcionando até 1873, quando acabou sendo inteiramente destruída por um grande incêndio na noite do dia 28 ao 29 de outubro de 1873.

Antigas Óperas de Paris: rue Richelieu e Le Peletier
Litografia: “Incêndio da Ópera Le Pelletier em 28 de outubro de 1873”. Autor desconhecido.

O terreno onde se encontrava a Ópera Le Peletier foi utilizado para uma nova reurbanização do bairro e das ruas do seu entorno. Hoje, não existe mais nenhuma sinal da sua existência.

Gostaria de conhecer a Ópera Garnier e outros monumento de Paris? Clique no botão abaixo para mais informações ou no botão do Whatsapp para um contato mais dinâmico. Até breve! Tom Pavesi!

Fontes:

  • “Opéra de Paris – salle Le Peletier”, no site Art Lyrique.
  • “L’Opéra de la rue de Richelieu”, no site Histoire de Paris.
  • “Dictionnaire historique des rues de Paris”, de Jacques Hilliret, (Ed. Les éditions de minuit, 1985).
  • “Opéra de la rue de Richelieu“, no site Wikipédia na língua francesa.
  • “Opéra Le Peletier”, no site Wikipédia na língua francesa.

5 Comentários


  1. Eu não sabia da existência dessas óperas. Conheço o Palácio
    Garnier, maravilhoso.
    Obrigada.

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  2. Olá,Tom! Muito Obg por enviar estes conteúdos,se não fosse sua atitude nada saberia. Deus te abençoe!

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  3. Muito obrigada por me enviar textos esclarecedores sobre monumentos de Paris. Sinto-me privilegiada por isso.

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