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O Culto da Razão surgiu em meados da década de 1790, como parte da tentativa de eliminar a influência da Igreja Católica e da monarquia absolutista na França. Para compreender a origem filosófica desse movimento, é necessário retroceder e examinar as influências intelectuais que o moldaram.
A Revolução Francesa, um dos eventos mais emblemáticos da história, foi marcada por mudanças sociais, políticas e culturais que moldaram o mundo contemporâneo. Entre as transformações mais notáveis desse período, destaca-se a ascensão do Culto da Razão, um movimento filosófico que refletiu os ideais iluministas e os princípios da Revolução.
Os filósofos do Iluminismo, como Voltaire (1694-1778), Montesquieu (1689-1755), Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e Diderot (1713-1784), foram os precursores desse Culto. Eles promoveram a ideia de que a razão humana era a ferramenta fundamental para alcançar o progresso, a justiça e a liberdade. Defendiam a separação entre a Igreja e o Estado, argumentando que a religião muitas vezes era usada para manter o poder opressivo.
Princípios e significados do Culto da Razão
Um dos princípios centrais do Culto da Razão era a crença na capacidade da razão humana de construir uma sociedade baseada na Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Inspirados pelos ideais iluministas, os líderes revolucionários buscavam promover o pensamento crítico, a educação e a secularização da sociedade ou seja o abandono dos preceitos culturais que se apoiam na religiosidade. Eles acreditavam que a razão, em vez da religião, deveria ser o alicerce da moralidade e da ética.
Em 1793, durante o governo radical conhecido como o “Reino do Terror”, a Convenção Nacional Francesa proclamou o Culto da Razão como a religião oficial do país. Templos da Razão foram estabelecidos em toda a França, e as cerimônias religiosas foram substituídas por celebrações da razão. Essas cerimônias incluíam discursos, música, dança e a leitura de textos filosóficos.
Festa da Razão
Em 10 de agosto de 1793 foi realizada na praça da Bastilha, a primeira Festa da Razão ou Festa da Unidade e Indivisibilidade celebrada pelo presidente da Convenção Nacional, Hérault de Séchelles (1759-1794). Na ocasião foi erguida uma alegoria egípcia da natureza, em forma de estátua de gesso da deusa Ísis, ladeada por dois leões sentados, e que jorrava água dos seus seios. Nomeada como a Fonte da Regeneração.
A deusa Razão, também conhecida como a Deusa da Liberdade ou “Liberté” foi um símbolo icônico durante o período revolucionário francês (1789 e 1794), e seu culto desempenhou um papel central na efêmera religião do Culto da Razão celebrada em inúmeras igrejas transformadas em Templos da Razão.
O “culto” manifestou-se entre 1793 e 1794 (anos II e III) através de procissões carnavalescas, desnudamento de igrejas, cerimônias iconoclastas, cerimônias de mártires da revolução, etc. As cerimônias eram destinadas a substituir os cultos religiosos tradicionais, vistos como símbolos do antigo regime e da opressão.
Em 20 de Brumário de 1793, do calendário republicano francês ou 10 de novembro de 1793, do calendário gregoriano houve uma grande Festa da Razão organizada por Pierre-Gaspard Chaumette (1763-1794), procurador da Comuna de Paris, no interior da Catedral de Notre-Dame de Paris, renomeada para o evento como “Templo da Razão“.
A estátua da Virgem Maria foi retirada do altar-mor da catedral, e substituída por uma montanha feita em madeira. Num cenário de inspiração antiga, algumas jovens, sacerdotisas da filosofia, celebraram o culto da deusa Razão. No alto da montanha a deusa foi personificada por uma jovem atriz chamada Thérèse-Angélique Aubry (1772-1829), vestida em branco drapeado coberta por uma túnica azul (em referência ao manto da Virgem Maria), usava um boné frígio dos revolucionários e iluminada pela tocha a liberdade, símbolo a primazia da razão sobre a religião.
A Festa teve como objetivo substituir os rituais religiosos tradicionais da Igreja Católica por celebrações baseadas na razão e no pensamento secular.
Membros da Comuna de Paris estavam escoltados por um coro de meninas vestidas de branco e coroadas com folhas de carvalho ficaram na base da montanha, dançando e cantando. Muitos discursos enfatizavam os princípios da Revolução Francesa, como a liberdade, a igualdade e a fraternidade.
Finalizada a festa na Notre-Dame, o cortejo continuou pelas ruas de Paris até os jardins das Tulherias, onde encontrava-se a sede da Convenção Nacional. A deusa Razão depois de cortejada pelo Presidente da casa e seus representantes políticos voltou a Catedral aclamada pelo população em êxtase pela nova ordem social e política do país.
Fim do Culto da Razão
O Culto da Razão, no entanto, não sobreviveu por muito tempo. Foi substituído pelo Culto do Ser Supremo, uma tentativa de criar uma religião deísta que incorporasse elementos religiosos mais tradicionais. A Revolução Francesa estava em constante evolução, e a religião e a filosofia eram frequentemente usadas como ferramentas políticas para atingir objetivos específicos.
Agora, tanto o Culto da Razão como e os eventos ocorrido nas Festas da Razão encontraram resistência de muitos setores da sociedade francesa. O governo revolucionário liderado por Robespierre (1758-1794) tentou substituir o “Culto” pelo Culto do Ser Supremo, uma religião deísta mais moderada, como parte de seus esforços para estabelecer um equilíbrio entre a razão e a espiritualidade.
Apesar de sua efemeridade, o Culto da Razão deixa um legado duradouro. Ele ilustra como os ideais filosóficos podem influenciar e moldar movimentos políticos e sociais. Além disso, ele destacou a importância da razão como um princípio orientador na busca pela justiça e pela igualdade, princípios que continuam a ressoar na sociedade contemporânea.
Conclusão
O Culto da Razão na Revolução Francesa teve suas raízes na filosofia iluminista, que promovia a primazia da razão humana como uma força transformadora. Embora tenha sido efêmero, ele desempenhou um papel significativo na tentativa de remodelar a sociedade francesa, estabelecendo a razão como a pedra angular dos ideais revolucionários de liberdade, igualdade e fraternidade.
Após a queda de Robespierre e a ascensão de Napoleão Bonaparte (1769-1821), a deusa Razão e os princípios que ela representava continuaram a influenciar o pensamento político e filosófico na França e em todo o mundo. Ela permanece como um símbolo duradouro da busca pela razão, liberdade e justiça, que continuam a ser valores centrais na sociedade moderna.
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Fontes bibliográficas:
- L’église Notre Dame devient temple de la Raison , de Gérard Michel (Obermund).
- “Le culte de la raison et le culte de l’être suprême (1793-1794)“, por Alphonse Aulard (Paris, Félix Alcan, coleção: “Bibliothèque d’histoire contemporaine” 1892, VIII-371).
- “Culte de la Raison”, Wikipédia versão francesa.