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Detalhes do teto de Chagall na Ópera Garnier. O vídeo abaixo foi feito por um drone é um trecho do documentário realizado em 2014 por Laurence Thiriat para TV Arte, onde descreve a história do projeto do teto de Chagall controvérsias e polêmicas na época, detalhes da instalação e um pouco do universo iluminado imaginário e colorido da vida de Marc Chagall para o templo da música e a da dança, em Paris.
História e política:
Sobre a presidência de Charles de Gaulle (1959-1969), o Ministro da Cultura da época, André- Malraux (1901-1976) tomou uma decisão audaciosa de renovar a Ópera Garnier. Para muitos uma decisão errada, pois temiam os puristas que essa renovação destruiria todo um patrimônio nacional símbolo monumental de Paris construído durante o regime imperial de Napoleão III (1852-1870).
O motivo da reforma além da promoção politica dos ministros da época Malraux e Georges Pompidou (futuro Presidente da França de 1969 e 1974) foi para dar um novo poder de atração para Paris ou melhor, mais “Glamour” para cidade que havia sido perdido durante a ocupação alemã na 2° guerra mundial.
Para concepção do novo teto foi contratado em 1963, o pintor Marc Chagall (1887-1985), russo-judeu-francês, também vitralista, ceramista, gravador e uns dos mais influentes artistas do século XX apesar de não seguir a nenhuma escola artística da época. Era influenciado pelos vanguardistas modernos, apresentando em suas obras características surrealistas, expressionistas, fauvistas, cubistas ou primitivistas, sempre criados por sua própria inspiração.
Chagall comentou com um escritor sobre polêmica em torno do seu nome: “É incrível a forma como os estrangeiros desagradam aos franceses. Você vive aqui a maior parte da vida, você se torna um cidadão francês naturalizado, trabalha de graça para decorar catedrais e ainda desprezam você. Você não é um deles.”
Mesmo assim, Chagall aceitou o projeto a título de cortesia apesar ter sido acusado ter ficado rico com a obra, na verdade não recebeu nenhuma renumeração do Estado.
Levou um ano para ser concluído em 1964. A tela final tinha quase 220 m² e exigiu 200 kg de tinta.
Problemas técnicos:
Para realização da obra, Chagall teve que resolver um verdadeiro problema técnico que foi a substituição do antigo painel pintado em 1872 por Jules-Eugène Lenepveu (1819-1898): “Les Muses et les Heures du jour et de la nuit”, que estava em péssimo estado de conservação devido aos anos de iluminação a gás da sala.
Sem destruir a obra de Jules-Eugène Lenepveu, que ainda hoje se encontra lá, Chagall simplesmente ocultou-a atrás dos seus painéis coloridos em 1964.
“Les Muses et les Heures du jour et de la nuit (1872)”.
Chagall teve que dividir a aérea central do teto (240 m²) fazendo em 24 geométricos painéis triangulares em resina de poliéster e depois revesti-los com uma tela de pintura.
Como o desenho final já havia sido preparado anteriormente, cada um desse painéis triangulares foram pintados em vários dos seus ateliês: Paris (museu “des Gobelins”), Meudon e Vence (onde faleceu aos 97 anos).
Teve uma preciosa ajuda de três pintores assistentes que merecem também um reconhecimento: Roland Bierge, Jules Paschal et Paul Versteeg.
Depois de pronto foram fixados lado a lado e instalados no teto por cima da obra original de Lenepveu.
Em 23 de setembro de 1964, a obra foi apresentada a um grande público que lotou a sala no espetáculo de dança orquestrada chamado a “Sinfonia n° 41 de Mozart” ou “Júpiter” (compositor preferido de Chagall). Nas últimas notas, todas as luzes do grande lustre de bronze e de cristal (projeto de Garnier) se acenderem iluminando o teto de forma espetacular e inesquecível para quem estava presente.
A intervenção de Chagall foi considerada para muitos, uma ruptura com a arquitetura eclética de Garnier, mas ao mesmo tempo, a beleza do conjunto da obra deu continuidade para harmonia da sala, onde tudo ficou mais vibrante e intenso com seus desenhos coloridos no teto. Cores em estado puro, onde o real e o imaginário se encontram juntos e sem limites.
Composição do Teto:
Marc Chagall faz uma homenagem pessoal a 14 compositores com suas famosas óperas e balé. Os dois painéis circulares de plástico (resina de poliéster) revestido com tela para pintura foram divididos em um painel principal externo, com 10 temas e um painel central, menor com 4 temas.
Painel Principal:
1 – Boris Godounov, de Petrovitch Moussorgski.
Em baixo podemos ver um Czar no trono e um pouco acima a cidade de Moscou. Acima a esquerda, a alegoria da fama com uma cabeça de monstro (divindade grega alada) tocando flauta.
2 – A Flauta encantada, de Mozart.
Um grande anjo voa sobre a cena e um pássaro (ou um galo) toca flauta, referência ao herói Tamino, homem pássaro que recebe este instrumento.
3 – Tristão e Isolda, de Wagner.
Um casal abraçado e um pouco acima a direita, o Arco do Triunfo (iluminado em vermelho, cor da paixão), e ao fundo a esquerda, a praça da Concórdia.
4 – Romeo e Julieta, de Berlioz.
Casal abraçado ao lado de um cavalo.
5 – Uma Ópera, de Rameau.
Fachada da Ópera Garnier iluminada em vermelho da paixão e a escultura em proporção monumental “A Dança”, de Carpeaux.
6 – Pelléas et Mélisande, de Debussy.
Pelléas observa Mélisande da janela. Acima deles, a cabeça de um rei (Arkel ?).
7 – Daphnis et Chloé, de Ravel.
Torre Eiffel (tema muito representado em suas obras) e um templo em azul.
8 – O Pássaro de Fogo, de Stravinsky.
Na parte superior, a esquerda um homem (Chagall ?) segura uma palheta de tintas acima de um pássaro esverdeado. Mais abaixo, domos e telhados do Castelo Mágico. Um pássaro vermelho se aproxima de um casal coroados e protegidos por um “dais” (tenda), também vermelho. Ao lado deles, um casal recém-casado, uma camponesa segurando uma cesta de frutas e a esquerda (lado da Torre Eiffel), uma orquestra tocando música. A direita um violonista abraçado no seu instrumento.
9 – O Lago dos Cisnes, de Tchaikovsky.
Uma mulher cisne, em um lago azul segura um buquê de flores. Acima um anjo músico, cuja a cabeça e o corpo, tem a forma de um violoncelo.
10 – Giselle, de Adolphe Adam.
A dança das camponesas junto as arvores da cidade, 1° ato.
Painel Central
11- Carmen, de Bizet.
Carmen na arena, em companhia de um touro tocando violão.
12 – La Traviata (?), de Verdi.
Próximo a um jovem casal, um homem barbado segura um rolo desenrolado.
13 – Fidélio, de Beethoven.
O Impulso de Leonora em direção ao cavaleiro azul que levanta sua espada.
14 – Orfeu e Eurídice, de Gluck.
Eurídice toca lira (Instrumento de Orfeu) e o anjo lhe oferece um buquê de flores.
Conclusão:
A arte de Marc Chagall estava muito relacionada com música, um elemento fundamental em sua vida que o ajudava a pintar de forma envolvente com espírito alegre, pleno de amor e poesia. Não dramatizava temas, pois para ele tudo era místico, lírico, de pura compaixão e felicidade.
Hoje, quem for fazer uma visita da Ópera Garnier verá indiscutivelmente um dos mais belos templos da dança e da música do mundo.
Visitando a Ópera tendo eu, Tom Pavesi, como Guia Credenciado, você conhecerá um pouco mais das histórias, lendas e dos costumes da aristocracia parisiense do final do século XIX.
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Fotos: © Adagp, Paris 2014 Chagall ®
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Perfeito Tom Pavesi.
Uma aula de beleza.
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Mais num artigo sensacional do Tom…. Uma esclarecedora aula de história. Ansioso para voltar na Ópera e observar com mais atenção , cada detalhe destacado. Parabéns!!
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Chego a nao ter palavras para descrever o respeito que tenho por Tom Pavesi……..sem duvida e um grande conhecedor de artes , de historia e de Paris.
Leio seus artigos sem parar. Adoro .
Espero que continue nos presenteando com essas reliquias que nos traz sempre …..
Boa sorte Tom …… sempre
Neusa Marques
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Nossa Neusa! Não sabia que tinha uma fã tão fiel e seguidora. Obrigado pelo carinho em suas palavras, e pode deixar que vou continuar escrevendo bastante histórias sobre Paris e a França, viu ?